No dia 17 de fevereiro de 2009, o então secretário de Turismo do governo cearense, Bismarck Maia, convocou a imprensa para anunciar aquele que seria o projeto mais ambicioso já tocado pela pasta: a construção do Acquario do Ceará, o maior da América Latina e o terceiro maior do mundo.
A estrutura seria monumental: ocupando um espaço de 21,5 mil metros quadrados, o Acquario seria dividido em subsolo, térreo e dois pisos superiores, com cinemas, túneis de observação submersos, simuladores de submarinos, elevador panorâmico da orla, 25 tanques de animais, esculturas, fontes e até um navio naufragado. A expectativa era abrigar 35 mil animais.
No mesmo ano, no dia 31 de maio, a FIFA anunciou Fortaleza como uma das cidades-sede da Copa do Mundo de 2014. O futuro Acquario, então, seria um dos cartões-postais com que os turistas iriam se surpreender ao visitar a capital cearense. O tempo era corrido, mas o governo bateu o martelo: a obra teria inicio em 2009, seria em 2010 e estaria aberta ao público em 2011.
Quatorze anos depois e R$ 112 milhões gastos, o Acquario do Ceará é, hoje, um esqueleto de concreto acumulando água de chuva, cercado de tapumes, repousando de frente para o mar em um dos principais pontos turísticos de Fortaleza. As obras estão paradas desde 2017.
Na última sexta-feira de 2023, o governo do Ceará assinou um protocolo de intenção para doar o esqueleto do Acquario para a Universidade Federal do Ceará (UFC), que pretende transformar a área em um novo campus universitário para o Instituto de Ciências do Mar (Labomar).
O novo campus vai contar com um “aquário virtual” e espaço de exposição para visitantes. Conforme a UFC, a expectativa é que o Campus Iracema, como é chamado oficialmente, esteja pronto em 2026. Não há previsão de quando as obras vão começar.
A proposta pretende pôr fim à novela que envolve a construção do Acquario, alvo de disputas judiciais, embargos ambientais e protestos, e dar uma resposta aos moradores da região, que convivem há anos com o esqueleto de concreto.
É o caso de Maria do Rosário, moradora do condomínio Vila de Iracema, localizado em frente ao Acquario. Ela acompanhou o projeto desde a concepção e recorda como recebeu a notícia à época.
“O primeiro pensamento que a gente tem é que é um equipamento [o Acquario] que vai desenvolver o bairro, que vai trazer uma atividade para um lado do bairro da Praia de Iracema que não tem atividade turística muito intensa. [A rua] só tinha um prédio abandonado velho e um lixo dentro. Então a ideia de trazerem algum equipamento para cá parecia ser em primeira mão uma coisa fantástica. Eles nos convidaram para apresentar o projeto, falaram que ia gerar muito emprego para o pessoal que mora no entorno, e assim foi muito fantasioso, mas depois foi muito desastroso”, resume Maria do Rosário sobre o projeto anunciado há quase 15 anos.
Obras do Acquario: calendário apertado e atrasado
A construção de um oceanário no Ceará foi apresentada em 2009, no primeiro governo de Cid Gomes, irmão do ex-ministro Ciro Gomes. A ideia foi levada à público pelo então secretário de Turismo, Bismarck Maia, hoje prefeito de Aracati, um dos principais destinos turísticos do Ceará.
O Acquario seria construído na rua dos Tabajaras, na Praia de Iracema, em um prédio abandonado do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), que funciona em um terreno da Prefeitura de Fortaleza, e que foi desapropriado em um acordo entre o município e o governo estadual.
A obra teria três etapas:
- Demolição do prédio antigo do Dnocs, escavação, construção do novo alicerce e do esqueleto de concreto
- Instalação dos equipamentos aquáticos
- Instalação da cobertura do Acquario com o esqueleto de metal, conforme o projeto arquitetônico
O prazo, como um todo, era apertado: o governo queria lançar o primeiro edital, de construção da estrutura de concreto do Acquario, no dia 1º de abril, menos de dois meses após anunciar o projeto. A previsão era de concluir as obras em 2010 e ter o equipamento aberto ao público em 2011. A empresa vencedora do primeiro edital, a CG Construções, foi anunciada no dia 8 de novembro de 2009.
Em 2010, ano em que Cid Gomes concorreria à reeleição, vieram os primeiros contratempos: no fim de janeiro, o governo Cid anunciou que, por questões financeiras, a obra do Acquario só seria efetivamente tocada na próxima gestão, isto é, no novo governo que iria começar em 2011.
Em março, antes até da demolição do antigo prédio do Dnocs, o Ministério Público entrou com um medida cautelar perante a Justiça solicitando que o governo estadual apresentasse um estudo de impacto ambiental. Em janeiro de 2011, o Ministério Público entrou com uma ação contra a obra. A obra do Acquario sequer havia começado, e o projeto já enfrentava sua segunda contenda judicial.
No dia 15 de dezembro de 2011, o Conselho Estadual do Meio Ambiente do Ceará (Coema) aprovou a obra com 22 votos a favor, um contra e duas abstenções. Com a aprovação do Coema, a Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace) emitiu a licença ambiental no dia 2 de março de 2012. O Acquario, enfim, poderia começar a ser construído.
Início das obras e disputa na Justiça
As obras do Acquario começaram, oficialmente, no dia 7 de março de 2012, três anos após o anúncio inicial do projeto. Porém, no dia 22 de março – 15 dias após o início oficial – as obras foram paralisadas a pedido do Ministério Público Federal (MPF).
O MPF recomendou que, antes de erguer um novo prédio, era necessário que o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) fizesse um estudo arqueológico no terreno.
O governo argumentou que não havia necessidade de fazer estudo arqueológico em uma área já “antropizada”, ou seja, que já havia passado por obras recentemente. Mais tarde, a Justiça daria razão ao governo cearense. Mas, naquele momento, o Iphan não acatou o argumento e embargou a obra no dia 26 de março.
Da Redação Na Rua News
Deixe o Seu Comentário